quinta-feira, 29 de junho de 2017





















Se isto ou aquilo
quem é que sabe ?
se belo e justo
seria perfeito
e mais ainda
se de boa vontade
seria supremo
grego por excelência
racional e humano
pensado no outro
moderno
isto pra quando ?
se o lucro vigora
o perverso e o injusto
a ganância
o dogma
o animal que compete
fere, mata, mutila
vence ?
avança ?
assim mesmo ?
quem  é que sabe ?
até quando funciona
até quando suporta
se é só o começo
ou o fim dos enganos














Eu aos sessenta
não sou eu aos dezoito
nem eu aos cinquenta
ou aos trinta e quarenta
nem quando
eu era criança
embora mantenha
o nome que tenho
e alguns traços de parecença
chamo passado
aos outros que eu era
e chamo futuro
ao que eu outro serei
se não morrer
antes da hora
sou como o rio
de águas diversas
que só é o mesmo
na sua aparência

Eu aos sessenta
sou eu aos dezoito
igual aos cinquenta
aos trinta e quarenta
aquilo que eu era
quando criança
Antonio Fernando
só um tanto mais velho
penso o passado
e me faço completo
mais um pouco é futuro
e se antes não morro
cumpro o destino
sou como o rio
de tantas águas
que se modifica
e mantém a essência

Eu como sempre
me faço a mesma pergunta
e como sempre respondo
de modo diverso
muito depende aquilo que penso
daqueles que encontro
e de como me olham
e de como os vejo
eles que também aos sessenta
parecem que eram os mesmos
parecem estranhos àqueles que eram














O buraco no muro
era só o começo
do mundo que havia
do outro lado do muro
como era buraco
alguém também via
daquele outro mundo
o mundo aqui desse lado
tinha um buraco no muro
e admirável era o mundo
quando nos víamos
olhando por aquele buraco









Assim por onde passo
eu me despeço
seja daquilo que vejo
sejam daqueles que encontro
na terça eu ia na igreja
na sexta eu ia na banca
havia um encontro marcado
alguém me esperava no sábado
por isso eu escrevo
em nome dessas histórias
em atenção às palavras
que se negam a ficarem caladas
se saio à procura
as estrelas são outras
ou o céu é escuro
então eu me perco
e só naquilo que escrevo
descubro o caminho de volta














A última vez que nos vimos
chovia naquele domingo
e o cinza escorria
diante dos nossos olhos
o que morreu enquanto chovia
continua morrendo todos os dias
como aquilo que resseca na planta
na planta que brota e persiste
apesar do tudo e do sempre
que nela morre e resseca












No poema escrito na pedra
assinei o teu nome
com todo cuidado
agora me alegro
quando leio na pedra
o poema que me foi dedicado















Bello, bello
partimos de Gênova
sem saber para onde
chamavam América
ao nosso destino
havia esperança
havia incerteza
no coração que ficava
no coração que partia













Escrevi descuidado
um poema às avessas
afirmei mentiras
como se fossem verdade
neguei verdades
como fossem mentira
terminado o poema
fiquei assustado
com tantas mentiras
que eram verdade
com tantas verdades
que eram mentiras














Aquilo com que eu sonhava
você sonhava junto comigo
a gente sonhava
sem que soubéssemos
o que aquilo seria
eu fui pelo rio
você foi pela floresta
nossos sonhos ficaram perdidos
sem que soubessem
por onde iriam
voltei pela floresta
pensando em você
pensando no rio
e em tantos caminhos
por onde os sonhos se perdem


Já não era meu tempo
mas incomodava
a inefável beleza
oceano que era
de todas as águas
profundamente avesso
a um velho riacho
raso e estreito
carente de águas

Se fosse o começo
seria um atalho
seria um tropeço
aonde quer que eu andasse

Quando se parte
de onde se chega
se engana quem pensa
se pensa que volta

A luz se renova
e na claridade eu vejo
estes olhos tão verdes
este corpo perfeito
meus olhos não sabem
permanecerem fechados












Edifícios, viadutos
tratados, estatutos
tudo está pronto
para ser destruído
como diziam
aqueles que não escreveram
o que foi produzido
já está com os dias contados
o inverso do errado
nunca deu certo
o trabalho que o homem começa
não se sabe quando termina
o homem deseja
colher o fruto perfeito
e servi-lo à vontade
sem que se invente o pecado
nem que se faça
qualquer julgamento
e que não se peça licença
para navegar pelo mares
e que se ouçam as palavras
silenciosamente faladas
alguém veio de longe
alguém que quando menino
ouvira as cantigas 
de negras e índias
e que olhando as ruínas
ainda sonhava
com as coisas da aldeia















Quando olhei novamente
já havia passado
eu poderia voltar
e quem sabe veria
decidi não fazê-lo
e fiz essa escolha
melhor iludido
pensando que era
que desapontado
revelado o mistério













O que não querias
e rejeitavas
o que desprezavas
e sequer cogitavas
nem indagavas
para saber o que era

Aquilo que estava
e que sempre estivera
aquilo que seria
o que jamais esperavas
que fosse um dia
a tua certeza
a tua alegria
















O manacá encantado
desabrocha branco
o manacá delicado
desabrocha rosa
o manacá desabrocha
o branco e o rosa
e nos encanta
com sua delicadeza














Segunda era preto
terça era cinza
quarta era branco
quinta era verde
sexta era santa
padroeira das cores
sábado era ouro
domingo brilhante
até às dezoito
muda-se tudo
trocam-se as tintas
a vida pinta a semana
com as cores que ela deseja
pode ouro a segunda
a terça se alegra
pode verde e amarelo
a quinta se confunde com a quarta
pode vermelho
azul, branco e rosa
o sábado começa na sexta
e pode arco íris
até quando termina o domingo

sexta-feira, 23 de junho de 2017





















Aqueles que buscaram respostas
passo horas
procurando descobrir
o que encontraram para minhas perguntas
olhando as estrelas
releio mentalmente os parágrafos
novamente releio
e os penso distantes
tão distantes
quanto as estrelas que vejo
mas são eles desafios
não são eles estrelas
então fecho a janela
e para eles retorno
uma fera me espera
uma fera me encara
desisto e sou devorado
ou resisto e descubro
que há outras perguntas
que não foram feitas











Desejo
que a porta se abra
e detrás dessa porta
outras portas
estejam abertas
Desejo
que a viagem prossiga
livre e não se detenha
em porta alguma
que se encontre fechada
e caso esteja
que se tenha aprendido
como fazê-lo
para que ela se abra














Arroz com feijão
purê de mandioca
farinha de milho
e torresmo
bife com ovo frito
limão à vontade
na salada verde
ai, que pobreza
diria o esnobe
ai, que delícia
diriam os deuses













Sobretudo acredito
naquilo que você me fala
e quando decido
antes escuto
o que você tem para ser dito
e sempre acerto
quando faço
o que foi dito
que deveria ser feito
desconheço outro jeito
que possa ser feito
sem saber o que você pensa
sem ouvir aquilo que você fala
e quando você se cala
espero o tempo que seja preciso
eu deixo de lado
seja qual for o desejo
e só satisfaço minha vontade
se você me olha
e diz como deve ser feito











Na sala repleta 
alguém sempre fala
alguma coisa indevida
o sorriso da moça
conta uma história
quando se olha pra ela
lá fora a noite não tarda
e as estrelas se perdem
enquanto a noite não chega
se o medo criasse coragem
não haveria perigo
na estrada deserta
ninguém sabe o segredo
e o segredo guarda consigo
o desejo de ser revelado
poderia e não poderia
um sujeito descobre
o inverso da descoberta do outro
quem sabe faça sentido
e a linguagem seja só o começo
do conhecimento pensado
na sala repleta
alguém sempre cala
o que deveria ser dito














Não há outro jeito
ou você se levanta
e se encanta
ou fica no escuro
com a janela fechada
o melhor é ser livre
e exibir os seus olhos
que ainda são belos
pense branco
e vista amarelo
deixe que as flores
se espalhem por seu vestido
e faça com seus cabelos
aquilo que você desejava
ter feito com eles
alguém te olha de alguma janela
alguém gostaria de ver seu sorriso
você pensa o que não deveria
você guarda aquilo que fere
e a tua ferida não sara
e a tua dor te consome
e o teu vestido amarelo 
te faz tanta falta
mas você não percebe
e nem leva em conta
que ele sempre se alegra
quando te veste