terça-feira, 26 de setembro de 2017
















você tão bonita
parece o encanto
aquele de quem
nunca me esqueço













nua te enfeitas
de água que escorre
de sol que ilumina
ondas te açoitam
rochas te sugam
gozo de algas
orgasmo de espumas












a vida me chama
a todo momento
não faltam convites
pra minha presença
se dou um suspiro
se pisco meus olhos
se dobro meus dedos
se sento e levanto
se faço meus cálculos
se penso a palavra
se recordo o passado
se antevejo o futuro
a vida me alerta
que o começo é perpétuo













não acredito nos deuses
mas a fúria dos deuses é incontrolável
não acredito nas bruxas
mas o malefício das bruxas é inegável
não acredito nos anjos
mas o socorro dos anjos é indispensável
não acredito nas sortes
mas o vaticínio das sortes é infalível
não acredito nos mitos
mas a força dos mitos é admirável
não acredito nos dogmas
mas a crença nos dogmas é indiscutível
não acredito nos sonhos
mas a mensagem dos sonhos é factível
não acredito nos homens
mas a mentira dos homens é compreensível
concebe o imponderável diante do inexplicável

domingo, 24 de setembro de 2017











depois de te amar
Deus se desfez
dentro de mim
converti-me em descrer
e naveguei pelo mar
do permanente ruir
desamei o nascer
secando o fluir
de todo meu ser













quando você se lembrar
esqueça outra vida
viva essa mesmo

sexta-feira, 22 de setembro de 2017

quarta-feira, 20 de setembro de 2017
















debaixo da mesa
os pés se mexeram
que lugares aqueles
por onde andaram














aquilo que avança
vence a resistência
daquilo que fica
como lembrança
do que era difícil













o amor desconhece
o que dele se pensa
palavras não dizem
o que dele se sabe

quando se sente
dele se aprende
que é fogo que arde
que é água que afaga












nasci de madrugada
naquela hora em que os passarinhos repousam
os grilos disparam a sua cantoria
os gatos namoram em cima dos muros

trovejava e relampeava
começavam as chuvas
e eram poucas as ruas
calçadas com pedras escuras

aleluias orbitavam
a luz amarela de ásperos postes
vaga-lumes não dispensavam o hífen
e luziam nos brejos que limitavam a cidade

a bossa era uma nova batida
cheia de peixinhos e saudade
um rei negro despontava na Europa
brasileiro branco amarelo

traços mal esboçados
vagamente pronunciavam Brasília
Portinari era verdade
que habitava o templo recém terminado

amigos que ali estivemos
nascendo e partindo na mesma viagem
alguns já chegaram não sabemos aonde
já faz tanto tempo que nem sei como ainda me lembro

quinta-feira, 14 de setembro de 2017













o malandro explica
e o mané acredita
que a banca é honesta

















aquela do Lupicínio
eu nem tinha nascido
mas gostei tanto
quando me contaram















 à minha poesia
falta aquilo que sobra
naquela dos verdadeiros poetas













aquele sonho
foi de outro mundo
eu acordado
e alguém me dizendo
que você tinha
- santa bárbara -
sonhado comigo










frustração pra valer
é morrer sem falar
a língua dos violões











rezam por mim
os que acreditam
que rezo por eles
rezaram por mim
quem não se importava
se eu rezava por eles











parto mais tarde
ainda te espero
acendo um cigarro
penso num verso
ouço os pássaros
guardo meus livros
limpo meus óculos
remexo os retratos
faço minhas contas
consulto o oráculo
a respeito do tempo
confirmo no google
qual é o trajeto
curto no face
as postagens recentes
revejo o espelho
ajeito os cabelos
examino a carteira
reconto o dinheiro
um tantinho de fome
belisco um salgado
o relógio me avisa
do último horário
refaço meus cálculos
e adio a viagem
meu anjo já sabe
que não me dou por vencido
mesmo que o jogo
tenha acabado












o Deus meu esteve na Síria
viajou pela Índia
navegou o Atlântico
descansou na Bolívia

o Deus meu se encantou com as igrejas
visitou quase todas
e se admirou da criatividade
em tantos projetos distintos

o Deus meu conheceu muitas casas
nos morros, em condomínios
dormiu em habitações improvisadas
debaixo de pontes, em campos de refugiados

o Deus meu se espantou com os presídios
neles se deteve por muitos dias
jamais concebera tanta maldade
sequer compreendia como a maldade podia ser presa

o meu Deus orava em silêncio
porque como se pensa
pra Deus nada é impossível
por isso ele ainda acredita nos homens

apesar de suas pátrias
apesar de suas crenças
apesar de suas casas
apesar dos presídios



















fui tonto e fui longe
o caminho de volta
perdeu-se no mapa

terça-feira, 12 de setembro de 2017


















sirvo aos amigos
os pratos que eles preferem
sozinho me farto
daquilo que me apetece
















feridos se despediram
ele partiu convencido que sentiria saudade
ela se arrependeu daquilo que irada dissera
anos depois se encontraram
ele havia engordado
ela não pintava os cabelos
ele falou dos seus netos
ela contou sobre suas viagens
sorrindo se despediram
ele partiu pensando em lugares que não conhecera
ela refletiu sobre seus filhos que nunca vieram


















três vezes mandaram
o mesmo recado
eu sabia quem era
que os havia enviado
estava sentada
junto com outras
ao fundo em frente
da nossa mesa
pensei como sempre
em seus olhos castanhos
os amigos disseram
vamos logo responda
quando disso recordo
até hoje me indago
porque diabos eu era
tímido como um caranguejo
















ele ostentava e se divertia
com a mancha que tinha
parte era claro
parte era escuro
seu pai era negro
sua mãe era branca
respondia sorrindo
que quando foi concebido
seu pai desejou uma branca
sua mãe desejou um negrinho















que seja a primavera
o encontro definitivo
daquilo que se confronta
então que se misturem a dor e a alegria
o quente e o frio
o amor e o ódio
o cheio e o vazio
a morte e a vida
que se fundam os contrários
se completem 
e assim permaneçam
e que o homem e o divino
se expliquem e se justifiquem
isso se espera
da estação que aproxima
mais nada além disso
que não sejam flores e espinhos
unidos sem se ferirem
















depois que os poemas partiram
as palavras se confundiram
e não houve mais jeito
de se escrever sobre coisas
que não se explicam

por isso os poetas 

ficaram perdidos
uns se mataram
outros sumiram
alguns se renderam 
ao canto dos vícios
não há mais espaços
- Carlos que o diga -
pra nenhuma poesia
que não sejam aqueles
onde as estátuas se fixam
















faças de conta
que sabes mentir
de olhos fechados
finjo que creio

firmamos o pacto
guardamos segredo
calamos ruídos
dançamos o fado

desviaremos os olhos
falaremos mais baixo
evitaremos encontros
sozinhos no quarto

se preciso te chamo
se me chamares te escuto
se estivermos famintos
quem sabe nos devoramos